quarta-feira, 4 de maio de 2016

Pela primeira vez, cientistas criam embriões humanos de duas semanas em laboratório


Pela primeira vez na história, cientistas desenvolveram embriões humanos fora do corpo da mãe durante quase duas semanas. O estudo, feito por um time de cientistas da Universidade Rockfeller, nos Estados Unidos, e da Universidade Cambridge, na Inglaterra, oferece um vislumbre inédito sobre os primórdios da vida, um dos estágios humanos mais misteriosos para a ciência. Os resultados da pesquisa, publicados nesta quarta-feira em dois artigos nos prestigiados periódicos científicos Nature eNature Cell Biology, podem trazer grandes avanços para tratamentos de fertilidade, terapias com células-tronco e medicina regenerativa, além de oferecer indícios preciosos para a compreensão da evolução humana.

Contudo, o trabalho traz também implicações éticas que vêm sendo discutidas com fervor nas instituições acadêmicas e científicas internacionais: no 14º dia, um depois do explorado pelos cientistas, o sistema neurológico do embrião começa a se desenvolver e é discutível se, a partir daí seria possível manter um embrião fora do útero materno. Afinal, qual o limite para a concepção e criação de um ser humano por vias artificiais?

"Este é um estudo pioneiro e pode ajudar na compreensão de como as primeiras células humanas se dividem e dão origem às trilhões de células que compõem cada um de nós. Ainda sabemos muito pouco sobre os primeiros estágios do desenvolvimento humano e esse conhecimento é fundamental para conseguirmos entender a nossa biologia", explica a biomédica Lygia da Veiga, geneticista-chefe do Laboratório Nacional de Células-Tronco Embrionárias da Universidade de São Paulo (USP).
"Mas, como em qualquer estudo inédito, precisamos parar e nos perguntar se é aceitável fazer esses experimentos em troca do conhecimento. Qual o limite para a criação dos embriões em laboratório? Duas semanas ou mais? Quais as consequências disso para a ciência e para os seres humanos? Precisamos discutir até onde queremos ir nesse aprendizado, pois já temos a ciência necessária para ir mais longe."

Duas semanas - Anteriormente os cientistas só haviam conseguido estudar embriões humanos em laboratório até, no máximo, o nono dia de desenvolvimento, quando é necessário o implante no útero da mãe para que sobrevivam e continuem a se desenvolver. O mais comum é que os embriões cresçam até o sexto ou sétimo dia fora do útero. No Brasil, os tratamentos de fertilização costumam utilizar embriões de até cinco dias - células mais desenvolvidas não fazem qualquer diferença para efeitos reprodutivos, e podem até ser prejudiciais ao futuro bebê.

Usando um método de cultura testado anteriormente para criar embriões de camundongos fora do organismo da mãe, os cientistas americanos e britânicos conseguiram realizar observações quase de hora em hora do desenvolvimento de embriões humanos para ver como eles se desenvolvem e se organizam até o 13º. dia - quase chegando a 14 dias, limite internacional considerado eticamente aceitável para as pesquisas de embriões desenvolvidos em laboratório. A partir do 14º. dia, com o desenvolvimento neurológico começa a se desenvolver algo que pode ser considerado um princípio de vida.

"Este é o estágio mais enigmático e misterioso do desenvolvimento humano", disse Magdalena Zernicka-Goetz, professora da Universidade de Cambridge e co-autora do trabalho à Reuters. "É um momento no qual a forma básica do corpo é determinada."

Os trabalhos descrevem a técnica usada para manter as células do embrião se multiplicando e a maneira como essas células que futuramente formarão o corpo humano se auto-organizam na estrutura básica de um embrião pós-implantação no útero.

"O desenvolvimento de embriões é um processo extremamente complexo, e embora nosso sistema possa não ser capaz de reproduzir plenamente cada aspecto deste processo, ele nos permitiu revelar uma capacidade de auto-organização notável que antes era desconhecida", explicou Marta Shahbazi, pesquisadora da britânica Universidade de Cambridge que fez parte das equipes de pesquisa à Reuters.

Ética dos estudos - As pesquisas também chamam a atenção para o limite ético que impede o desenvolvimento de embriões humanos em laboratório por mais de duas semanas afirmando que, no ponto em que as pesquisas se encontram, ele precisa ser revisto.

O período é crucial para o embrião, pois é o ponto em que começa a se individualizar - até o surgimento do sistema neurológico, as células se dividem intensamente. Após o 14º. dia, as células já estariam próximas do que seria um ser único, com tecidos e características próprias.

"Não existe uma lei internacional que regula o limite para a criação de embriões em ambientes artificiais. Essa é uma questão ética e seguimos dispositivos dessa área, dos direitos humanos e cortes internacionais que estabelecem o surgimento do sistema neurológico como uma fronteira para os estudos", explica médico Edson Borges, diretor clínico do Centro de Fertilização Assistida Fertility, em São Paulo. No Brasil, a resolução 2121 de 2015, do Conselho Federal de Medicina, estabelece que "o tempo máximo de desenvolvimento de embriões in vitro é 14 dias". O limite é incluído nas resoluções desde 1992.

Até o momento, esse período jamais havia sido ameaçado, pois a ciência ainda não havia elaborado técnicas capazes de fazer as células embrionárias progredirem por tanto tempo fora do corpo da mãe. De acordo com os cientistas, alguns dias a mais, além dos quatorze, poderiam ajudar os cientistas a compreender como os embriões de dividem em diferentes tecidos e organismos, por exemplo.
"O tipo de discussão internacional que pedimos poderia facilitar dar bases a decisões locais para mudar a lei ou a política das pesquisas", escrevem os autores no estudo da Nature.

De acordo com os especialistas, o debate sobre a pertinência desses estudos deve envolver cientistas, a comunidade acadêmica e também a população. Até o momento, as fases mais primitivas do desenvolvimento humano são conhecidas por meio da pesquisa de organismos mais simples, como vermes ou camundongos - as observações diretas sobre a divisão do embrião humano são ainda preliminares.

"Os critérios devem ser mais éticos que científicos", explica Borges. "A discussão deve abordar aspectos bastante controversos, como qual o início da vida e o limite da interferência humana em seus princípios."

http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/pela-primeira-vez-cientistas-criam-embrioes-humanos-de-duas-semanas-em-laboratorio

Nota do moderador sobre a materia em exposição 



Julio Cesar Carneiro disse:


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