O astrofísico nova-iorquino Neil deGrasse Tyson é um dos rostos
mais conhecidos da ciência por saber traduzir, com graça e elegância, o
intrincado linguajar de estudiosos. Em suas palavras, "mostra as reais
maravilhas do conhecimento". Ele faz isso por meio de livros best-sellers,
a exemplo do mais famoso deles, Origens, lançado em 2004 nos
Estados Unidos, mas que só na semana passada chegou ao Brasil. Dr. Tyson - como
é chamado - se assume como herdeiro de Carl Sagan, astrofísico que popularizou
a exploração espacial com o programa televisivo Cosmos, dos anos 80. Não por
acaso, é dele a reedição da série, que apresenta na Fox. Tyson é defensor
ferrenho do método científico como a melhor forma de explicar a origem de tudo
o que existe.
Seu livro
busca compreender a origem de tudo, seja a vida, seja o universo. Por que esse
tema é tão recorrente na ciência? Se queremos analisar uma
laranja, por exemplo, podemos verificar que ela é redonda, tem gosto cítrico.
Se na experiência de laboratório destruímos a fruta, basta buscar outro
exemplar e o trabalho prossegue. Essa lógica, de estudar a existência, vale
para tudo, de organismos a estrelas. Mas e se decidirmos compreender a origem
da laranja? Aí a situação se complica. Primeiro, é simples notar que ela vem de
uma árvore. E de onde veio a árvore? De uma semente. E a semente? Mais
complicação. Quando se pergunta sobre a origem de qualquer coisa, os
questionamentos não param. Em dado momento, é inevitável chegarmos a essa
indagação filosófica clássica: "Qual é a origem da vida?". Para
responder a essa questão, é preciso elaborar argumentos cuidadosos, factíveis,
mas extraordinariamente imaginativos. Por isso, tantas das mentes brilhantes da
humanidade se dedicaram ao desafio.
Diante da
dificuldade de chegarmos à origem de tudo o que está aí, uma busca infindável,
aparentemente eterna, não seria o caso de aceitar com mais naturalidade e
compreensão as interpretações religiosas? A
religião de cada um tira conclusões precipitadas sobre o funcionamento do
universo. A ciência, no entanto, realiza medições capazes de mostrar que essas
impressões são falsas. Até hoje as pessoas dizem "God bless you" (Deus
te abençoe, em inglês) quando alguém espirra. Por quê? No passado,
acreditava-se, para valer, que, quando isso ocorria, a alma saía do corpo e
deixava a pessoa vulnerável a demônios. Um religioso pode ver o mundo dessa
maneira. A ciência verifica que há bactérias que causaram o espirro, e ponto.
Um religioso pode aceitar as descobertas e passar a usar passagens de suas escrituras,
a exemplo da Bíblia, como metáfora, fonte de inspiração. Ou
entrar em conflito conosco. Há muitos, contudo, que souberam separar os
tópicos, ver a religião como motivação moral, e a ciência como a forma de
realmente explicar a natureza. Exemplo contemporâneo é o geneticista Francis
Collins, cristão e um dos intelectuais mais respeitados da atualidade. Ele tira
sua base moral da Bíblia, mas jamais responderá
a uma pergunta sobre a origem do universo dizendo: "Bem, vamos verificar
no Gênesis".
Os religiosos
veem a aparente ordem do universo, regida pelas leis da física, como prova de
que há uma lógica superior organizando tudo... Sim,
a natureza se repete, e por isso definimos regras, como a lei da gravidade. Mas
é preciso tomar cuidado com essa abordagem. O.k., Deus então fez as leis da
física, como já definia o filósofo Baruch Espinosa no século XVII. Só que isso
quer dizer que Ele ouve suas preces? Ou que ajuda religiosos a vencer guerras
contra outros religiosos? Ou que Ele tem barba? Foi esse Deus que falou com
Moisés? Se tudo isso for tomado como verdade, então podemos dizer que Deus
deixa pessoas inocentes ser atropeladas na rua. Ele permite, portanto, que uma
criança morra de leucemia. Ou ainda faz vista grossa diante de furacões e
vulcões que matam milhões, incluindo jovens e humanitários. Para acreditar em
Deus, é preciso levar tudo em conta. Se Ele está por trás de tudo, é muito bom
em matanças. Afinal, mais de 99,9% das espécies de seres vivos que passaram
pela Terra foram extintas. Isso é o acaso da natureza? Ou é Deus? Seja qual for
a resposta escolhida, é preciso assumi-la tanto para o lado belo como para o
terrível.
O senhor
acredita em Deus?Dediquei tempo para pesquisar listas de deuses
na internet. Demora muitos minutos só para passar com o mouse, sem ler, por um
compilado de divindades nas quais a humanidade acredita. São milhares! Quer
dizer que a escolha de um desses deuses pressupõe, sem escapatória, a
ilegitimidade de todos os outros? Esse conflito de ideias não é tranquilo,
levou a muitas guerras. Indo além, debrucei-me sobre o Deus mais popular do
Ocidente, o judaico-cristão. Quais são suas propriedades celebradas? A bondade,
o poder absoluto e a onisciência. Visto quanto a natureza mata, quer dizer que
Ele é assassino? Se sim, não é bondoso. Se não, Ele não é onisciente, ou todo-poderoso.
Para mim, essas escolhas parecem randômicas. Não vejo evidências que corroborem
a existência de Deus. Se há um terremoto, não é fúria divina. Geólogos avisaram
que a área era vulnerável. Não adiantava rezar pelo Haiti. O terremoto que
abalou o país recentemente ocorreria de qualquer jeito. Não me importo se
acreditam em deuses. Só acho que quem segue essa linha cega não pode distribuir
culpas por aí.
O senhor
utiliza frequentemente o termo "polícia do pensamento". É uma forma
de definir a postura religiosa que ignora solenemente o pensamento científico? Quando
emprego essa definição, é para falar das pessoas que tentam ter e exercer poder
pela força de seus pensamentos. Ou seja, impondo o que todos podem, ou devem,
acreditar. Essa é a "polícia". Na ciência, não fazemos isso. A
ciência é inimiga da "polícia do pensamento".
http://veja.abril.com.br/noticia/ciencia/nao-vejo-evidencias-que-corroborem-a-existencia-de-deus
Nota do Moderador desse blog, sobre a materia em exposição
Julio Cesar disse:
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